Antes desse corpo, embalagem forte-frágil, cheio de desejos e necessidades, com forma, textura, sensações, percepções, dimensão no tempo e espaço, às vezes adequado, em outras limitado e estranho.
Onde você estava antes dele?
Você se lembra?
Se lembra do que era feito, se tinha alguma forma, pequena ou grande, translúcida ou opaca, se tinha nome, identidade, conhecimento de si, se lembra?
Talvez não, talvez venha de muito longe, de um tempo anterior ao tempo já contado, de um tempo que ainda nem podemos conceber em nossos sonhos, aquilo que vem antes do que vem antes, exatamente esse tempo.
Pois eu me lembro. Me lembrava em criança, quando ficava sozinha e muito quieta, eu lembrava, mas como todas as coisas da infância essa eu não fui esquecendo, essa lembrança foi crescendo, ampliando em detalhes.
E por me lembrar bem antes de qualquer conceito, ideia, estudo cientifico, considero que sim, é uma lembrança de um fato ocorrido, o eu anterior a todos eus, o eu impalpável que já existia.
Depois, ao ler, estudar, fui descobrindo suas particularidades, coisas que já via em meus momentos de silêncio atento, só não sabia como se chamava, mas ali estava, estive, estou, não sei dizer ao certo, talvez tudo ao mesmo tempo.
Quando pela primeira vez, já adulta, li sobre a teoria da criação do universo, chorei, chorei de emoção...então não era afinal tola ilusão, esse lugar-acontecimento pode ter existido!
Será que mais outro alguém sentiu? Além da ciência e fórmulas matemáticas?
Sim, em textos da milenar Vedanta, em versos herméticos, expelidos pela respiração da divindade. Sim, eu já estive lá, dentro do inenarrável, imponderável, do tudo.
Enxergo, sinto, me expando, retorno. E agora, entre os seres humanos, num corpo humano, vivendo os danos, me confronto com a imaterialidade, eternidade.
O que devo mais dizer? Fazer? Contar?
Você se lembra de ter pertencido a tudo isso?
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